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A hibernação do castanheiro

Daria · 06.08.2025.

Com a chegada do outono e a descida gradual das temperaturas e do fotoperíodo, o castanheiro, como muitas outras árvores de folha caduca de climas temperados, inicia um processo fascinante e vital de preparação para o inverno. Este período, conhecido como dormência ou repouso vegetativo, é uma estratégia de sobrevivência fundamental que permite à árvore suportar as condições adversas do frio, da geada e da menor disponibilidade de água e luz. Durante a hibernação, a atividade metabólica da árvore reduz-se ao mínimo, conservando energia e protegendo os seus tecidos vitais até que as condições favoráveis da primavera seguinte sinalizem o momento de despertar e iniciar um novo ciclo de crescimento. Compreender este processo é crucial para aplicar os cuidados de maneio adequados durante esta fase aparentemente inativa, mas de grande importância para a saúde e produtividade futura da árvore.

A transição para a dormência é um processo gradual e complexo, regulado por sinais ambientais e hormonais. A árvore começa por translocar os nutrientes móveis (como o azoto e o fósforo) das folhas para os ramos, o tronco e as raízes, onde serão armazenados como reservas para o arranque na primavera. É por esta razão que as folhas mudam de cor no outono, revelando os pigmentos amarelos e laranja que estavam mascarados pela clorofila verde. Após a recuperação dos nutrientes, a árvore forma uma camada de abcisão na base do pecíolo da folha, que leva à sua queda (caducidade).

Durante o repouso invernal, embora a árvore pareça estar inativa, continuam a ocorrer processos fisiológicos importantes. A planta acumula as chamadas “horas de frio” (o número de horas abaixo de uma certa temperatura, geralmente 7°C), que são necessárias para quebrar a dormência dos gomos. Se o inverno não for suficientemente frio, a quebra da dormência pode ser irregular, resultando num abrolhamento desuniforme e fraco na primavera. É também durante este período que se completa a diferenciação dos gomos florais que darão origem à produção do ano seguinte.

O período de dormência é a altura ideal para realizar algumas das mais importantes operações de maneio no pomar, como a poda de manutenção e a aplicação de certos tratamentos fitossanitários de inverno. A ausência de folhas permite uma visão clara da estrutura da árvore, facilitando a identificação e remoção de ramos secos, doentes ou mal formados. Além disso, como a circulação de seiva está praticamente parada, o stress causado pela poda é menor e o risco de infeção de feridas por certos patógenos é mais baixo.

Preparação para o inverno: o que acontece à árvore

A preparação para a dormência é um processo de aclimatação ao frio, que aumenta a resistência da árvore às baixas temperaturas. Um dos mecanismos mais importantes é a alteração da composição química das células. A árvore acumula açúcares e outras substâncias solúveis no citoplasma celular, que atuam como um anticongelante natural, diminuindo o ponto de congelação da água dentro das células. Isto protege as membranas celulares e as estruturas vitais de serem danificadas pela formação de cristais de gelo. Uma descida gradual da temperatura no outono favorece uma melhor aclimatação.

Ao mesmo tempo que as folhas caem, os gomos, que contêm os primórdios das folhas e flores do ano seguinte, preparam-se para o inverno. Estes gomos são estruturas altamente resistentes, protegidas por escamas espessas e muitas vezes resinosas, que os isolam do frio e da desidratação. No interior do gomo, os tecidos estão num estado de desidratação controlada, o que também contribui para a sua resistência ao congelamento. A integridade destes gomos durante o inverno é crucial, pois deles depende todo o crescimento e produção da primavera seguinte.

O sistema radicular, embora também reduza a sua atividade, não entra numa dormência tão profunda como a parte aérea, desde que a temperatura do solo se mantenha acima do ponto de congelação. As raízes podem continuar a crescer lentamente durante o inverno, especialmente em solos mais quentes, e mantêm a sua capacidade de absorver água e nutrientes, embora a um ritmo muito baixo. Esta atividade radicular residual é importante para manter a hidratação da planta durante o inverno e para a acumulação de reservas.

As reservas energéticas, na forma de amido, são acumuladas principalmente nos tecidos lenhosos (raízes, tronco e ramos). Estas reservas foram produzidas pela fotossíntese durante a estação de crescimento e são o combustível que a árvore irá utilizar na primavera para suportar o abrolhamento e o crescimento inicial das novas folhas e rebentos, antes que estes sejam capazes de realizar a sua própria fotossíntese de forma eficiente. A quantidade de reservas acumuladas no final do ciclo vegetativo é um indicador da saúde da árvore e da sua potencial produtividade no ano seguinte.

Proteção de árvores jovens contra o frio

As árvores jovens, especialmente nos primeiros dois a três anos após a plantação, são muito mais sensíveis aos danos causados pelo frio do que as árvores adultas. O seu tronco fino tem menos capacidade de isolamento e os seus tecidos são mais tenros. Além disso, o seu sistema radicular é mais superficial e vulnerável ao congelamento do solo. Por estas razões, a proteção das jovens árvores durante o inverno é uma prática de maneio fundamental para garantir a sua sobrevivência e um bom desenvolvimento inicial.

Uma das medidas de proteção mais eficazes e simples é a pintura do tronco com uma calda branca, como a calda bordalesa ou uma tinta à base de cal. Esta pintura branca reflete a radiação solar durante os dias de inverno soalheiros, evitando um aquecimento excessivo da casca do lado sul e sudoeste. Este aquecimento pode levar ao descongelamento dos tecidos durante o dia, seguido de um congelamento rápido durante a noite, o que provoca fendas na casca conhecidas como “fendas de geada” ou “golpe de sol de inverno”. Estas feridas são portas de entrada para doenças, como o cancro.

Outra técnica importante é a proteção da base da árvore e da zona radicular superficial através da aplicação de uma camada espessa de mulching ou cobertura morta. Materiais como palha, folhas secas, casca de pinheiro ou estrume bem curtido, aplicados numa camada de 10 a 15 centímetros de espessura à volta do tronco (sem encostar diretamente a este, para evitar o apodrecimento), funcionam como um isolante térmico. Este isolamento ajuda a moderar as flutuações de temperatura no solo, protegendo as raízes mais superficiais do congelamento e da dessecação.

Em regiões onde as geadas são muito severas ou onde há presença de roedores que podem danificar a casca, a utilização de protetores de tronco individuais é altamente recomendada. Estes podem ser tubos de plástico microperfurado, redes ou mantas térmicas enroladas à volta do tronco. Estes protetores criam uma barreira física contra os roedores e uma camada de ar isolante que protege a casca das temperaturas extremas e dos ventos frios e secantes, que podem causar desidratação dos tecidos do tronco da jovem planta.

Cuidados com o solo durante o período de dormência

O período de dormência é uma excelente oportunidade para cuidar do solo do pomar e prepará-lo para a estação de crescimento seguinte. Uma das práticas mais benéficas é a aplicação de matéria orgânica. A distribuição de composto ou estrume bem curtido na linha das árvores durante o outono ou inverno permite que as chuvas invernais incorporem gradualmente os nutrientes no solo, tornando-os disponíveis para as árvores na primavera. Além disso, como já referido, a matéria orgânica melhora a estrutura do solo e a sua capacidade de retenção de água.

A gestão do coberto vegetal nas entrelinhas também é importante. Se for semeado um adubo verde no outono, este crescerá durante o inverno, protegendo o solo da erosão causada pelas chuvas intensas. Esta cobertura vegetal compete pouco com as árvores, que estão em dormência, mas tem um grande impacto positivo na saúde do solo. Se, pelo contrário, se optar por manter a entrelinha com um coberto espontâneo, este deve ser mantido baixo através de ceifas, para não abrigar roedores e para facilitar as operações de inverno.

A realização de uma análise de solo durante o período de dormência é uma prática recomendável, pois permite planear a fertilização para a campanha seguinte com a devida antecedência. Com os resultados da análise, podem ser tomadas decisões sobre a necessidade de corrigir o pH ou de aplicar fertilizantes com nutrientes menos móveis, como o fósforo e o potássio. A aplicação destes nutrientes durante o inverno garante que estarão na solução do solo e disponíveis para serem absorvidos pelas raízes assim que a atividade da planta recomeçar na primavera.

Embora a mobilização do solo em pomares estabelecidos deva ser evitada para não danificar as raízes superficiais, em certas situações, uma mobilização muito superficial pode ser considerada. Por exemplo, para incorporar a matéria orgânica ou os fertilizantes, ou, como mencionado anteriormente, para expor as larvas hibernantes de pragas como os gorgulhos. No entanto, a tendência moderna na fruticultura é para a manutenção de um coberto vegetal permanente e a não mobilização do solo, uma prática que promove a sua saúde e biodiversidade a longo prazo.

Atividades de manutenção de inverno

O inverno é, por excelência, a época para a realização da poda de formação (em árvores jovens) e da poda de manutenção ou frutificação (em árvores adultas). A ausência de folhas oferece uma visão desimpedida da arquitetura da árvore, tornando mais fácil identificar os ramos a remover: os que estão secos, doentes, partidos, os que se cruzam ou crescem para o interior da copa, e os ramos “ladrões” que crescem demasiado vigorosos e na vertical. Esta poda visa equilibrar a árvore, melhorar a penetração da luz e do ar e renovar os ramos produtivos.

Após a poda, é fundamental recolher e retirar do pomar todos os ramos cortados, especialmente se apresentarem sinais de doenças como o cancro. A queima ou a trituração destes restos de poda é a forma mais segura de destruir o inóculo de patógenos, evitando que estes possam infetar as árvores na primavera seguinte. Nunca se devem deixar os ramos doentes amontoados no pomar, pois funcionariam como uma fonte de contaminação.

O período de dormência é também a altura ideal para a aplicação de tratamentos fitossanitários de inverno. Um tratamento com um produto à base de cobre (como a calda bordalesa), aplicado após a poda e antes do abrolhamento, pode ser muito eficaz na redução do inóculo de várias doenças fúngicas e bacterianas. Este tratamento cobre os tecidos da árvore, incluindo as feridas da poda, com uma película protetora que impede a germinação dos esporos dos fungos quando as condições se tornarem favoráveis na primavera.

Finalmente, o inverno é um bom momento para a manutenção geral do pomar. É a altura para reparar ou instalar o sistema de rega, verificar e afiar as ferramentas, reparar vedações e planear as atividades e a aquisição de materiais para a próxima campanha. A plantação de novas árvores ou a substituição de marras (árvores que morreram) também deve ser feita durante o repouso vegetativo. Um bom planeamento e execução das tarefas de inverno são essenciais para começar a nova estação de crescimento nas melhores condições possíveis.

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